Olá amigos do blog.
Na verdade há um trecho técnico, que se encontra no meio da via, em que você precisa escalar uma parede de gelo íngreme de ~30m por cima de uma grande e sinistra fenda. Esse trecho é chamado de Pala Chica.
Mas há ainda dois trechos bem complicados: um no início e outro no final.
No início você tem que passar por uma parede de rocha com gelo pontual. Esse trecho é bem exposto e uma queda ali pode ser fatal (quando inexperiente, comum escorregar na passada mesmo com bota dupla). O detalhe principal é que não há nenhum tipo de segurança nessa etapa e a dica é fazê-lo já com crampons (o que permite você fugir das rochas e buscar maior estabilidade no gelo).
Já o final ou Pala Grande, embora não tão técnico quanto o Pala Chica é de longe o mais difícil. A essa altura você já está morto de cansado, sem ar e com fome (frio não, pois o sol já deve estar nascendo a essa altura) e já bem perto do cume. A dificuldade é subir um pedaço muito íngreme da montanha por uma trilha muito estreita e pouco definida. Nessa parte é comum ter que abrir caminho por penitentes de gelo e se desequilibrar.
O cume do Huayna Potosi é algo surreal. É estreito (não cabe muitas pessoas por lá, o que deve gerar uma fila de espera nas imediações nos dias e horários de grande fluxo) e em formato de um trono de gelo. A sensação de conquistá-lo é algo inesquecível, indescritível e certamente viciante.
O que a faz ter essa fama de montanha fácil entre os montanhistas é o fato de ser pouco técnica e possuir algumas facilidades. Talvez a principal dessas "facilidades" seja os dois acampamentos fixos que possui (acampamento base a 4700m e o acampamento alto a 5200m). Esses oferecem toda estrutura como cama, cozinha, água, luz, banheiro e assim facilitam toda a logística e o principal: economizam peso na sua mochila.
Fui muito fraco para a primeira etapa (pela diarréia dos dias anteriores e pela falta de apetite) e consegui completar o Pico Austria com muito esforço, ficando exausto para atacar o Pequeño Alpamayo na madrugada do dia seguinte. Com pouco tempo para descansar partimos rumo ao cume do Pequeño Alpamayo. O guia estava com uma pressa terrível nesse dia e não demonstrava nenhuma estímulo em me levar ao cume. Desisti, quase chegando ao cume do Tarija (5240m), ao descobrir que a minha água havia congelado na mangueira da mochila e o guia não carregava água alguma com ele (seis horas de caminhada e escalada sem água não dá né amigo).
Então a outra dica é não economize na hora de escolher a agência e principalmente o guia. Peça a descrição do trajeto, com etapas, estude cada trecho (escalar às cegas é sempre mais complicado), deixe bem claro que o guia que for contigo terá que ter muita paciência. Para os nativos a altitude não é problema, mas pra você certamente será... deixe isso bem claro. Avaliar o atendimento e testar/analisar a agência antes de abrir a carteira é fundamental nesse processo. Saiba negociar com coerência, pesquise bastante sobre a agência nas avaliações da net (Facebook, Tripadvisor...) e fuja de agências que possuem vários nomes (trocam de nomes quando mal avaliados).
Voltei chateado para La Paz tanto com o guia como com a agência e também comigo. Estava até pensando em desistir do Huayna Potosi: o único e grande motivo da minha ida a La Paz. Ficou um sentimento de que haviam me empurrado algumas montanhas com a desculpa de me aclimatar mas na verdade não se importavam nem um pouco em conseguir me levar até o cume (parecia que quanto antes eu desistisse... melhor pra eles). No entanto, fui entender mais tarde que esse insucesso do Pequeño Alpamayo é que me levaria a ter êxito no cume do Huayna Potosi. Sabia que esse meu desanimo não duraria muito e me sentindo melhor fisicamente, com energias, iria voltar a pensar nesse meu grande desafio.
Com 9 dias comecei a sentir fome novamente, mesmo que ainda de forma discreta. Já não sentia tanto cansaço e nem tão pouco tontura ou dor de cabeça (meu corpo estava se adaptando a altitude).
Logo comecei a pesquisar outras agências e encontrei uma que me fez acreditar que seria possível: a South America Climbing. Um ótimo atendimento no pré-venda, promessa de um dos seus melhores guias credenciados pela UIAGM... me pareceu que queriam o cume tanto quanto eu. Vi então que o meu sonho, a razão de toda essa viagem, era possível SIM.
Partimos rumo a Huayna Potosi dia 20 e atacamos o cume dia 22/08/2021. Foi “despacito” ou devagar em bom português, que conquistei o tão sonhado objetivo. A calma e perseverança foram o combustível para o sucesso dessa tão difícil empreitada.
Muitas vezes me peguei dormindo andando na escuridão daquela madrugada (saímos a 1:00am). Foram inúmeras, constantes e breves as pausas que fazíamos pelo caminho. Me faltava ar, energia, mas me sentia confortável e tranquilo. Entretanto, a tranquilidade me abandonava sempre que precisava fazer algum esforço diferente daquele de um passo após o outro. Foram muitas as vezes que a minha pior versão me dominou fazendo-me pensar em desistir... até mesmo quando tinha o cume ao alcance dos olhos.
Faltando somente 20 minutos para ser conquistado, já não aguentava mais, a minha bateria estava em 5%. Aquele pensamento persistente em desistir insistia em me convencer... mas não conseguiu. Fui meio que me arrastando e passando cada último obstáculo em uma lentidão mórbida... mas me superei! Agradeço muito ao meu guia Andres Choque e a toda equipe da South America Climbing.
Essa foto tirei logo que cheguei no cume. O guia pediu para eu sentar (o cume tem formato de um trono de gelo) que ele tiraria algumas fotos... dormi de tão exausto que estava (reparem os olhos fechados que não conseguiam abrir).
Agora é começar a pensar nos próximos passos e quem sabe também tentar voltar ao cume do Huayna Potosi novamente... pois agora tenho um carinho especial por ela (meu primeiro 6000m).
A Bolívia é um país seguro, barato e com uma boa estrutura de montanha. Não tive problema com imigração ou qualquer departamento do país. Fui muito bem recebido e acolhido. Certamente esse será um dos meus locais preferidos para a prática em alta montanha.
Quanto a atingir o cume de uma alta montanha sempre irei me lembrar da frase que o meu guia nessa aventura me disse:
“Há pessoas que nunca subiram uma montanha na vida e conseguem o cume do Huayna enquanto montanhistas profissionais já tentaram e não conseguiram. Não há lógica nisso.”
Sendo assim, até a próxima aventura!!!
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